terça-feira, 24 de março de 2009

Capítulo XVIII - O Retorno de Ambrósio


Ambrósio não conseguia se lembrar exatamente de quem era. Imagens confusas de um travesti loiro com uma moto-serra lhe vinham à mente, enquanto ele reconhecia alguns trechos do caminho. Acabou chegando até à porta de sua casa, mas não teve coragem de entrar, especialmente porque não tinha a menor idéia de que lugar era aquele de fato. Viu que dois homens jovens conversavam sentados num banco da varanda.
O dia estava quase nascendo. Do outro lado da rua, Ambrósio reconheceu algo de familiar naqueles rostos. Mas quem seriam? Aliás, quem seria ele mesmo? O homem subitamente percebeu que sequer podia se lembrar de suas próprias feições. Procurou algum vidro ou espelho onde pudesse se ver refletido. Numa grande e quieta poça d'água, viu seu rosto monstruoso. Com um grito aterrador correu rumo a um matagal próximo. Estava confuso e com medo.
Bruno e Adenair ouviram o grito, mas não deram muita importância.
- Você pode se abrir comigo, Bruno. Sei tudo a respeito de Jeitosinha.
- Tudo? - surpreendeu-se.
- Sim. Ela é uma vítima, tanto quanto você.
Pelo comentário, Bruno percebeu que talvez Adenair não soubesse que a irmã era uma prostituta. "Se ela conseguiu me enganar, porque não enganaria o irmão?" - perguntou-se.
Tombando diante da pressão, Bruno chorou convulsivamente. Adenair puxou-o em direção ao peito, abraçando-o e acariciando seus cabelos. Bruno pôde perceber que o toque e o suave perfume do rapaz lembravam muito os de sua irmã. Sentiu-se confortável por alguns minutos.
Enxugando as lágrimas, Bruno viu bem de perto os olhos de Adenair, tão parecidos com os de Jeitosinha. Só então deu-se conta de que algo estranho acontecia ali. O apoio que estava recebendo, físico e mudo, não é comum entre dois homens.
- Adenair, porque você me abraçou deste jeito? - perguntou, temendo a resposta.
Em um matagal a poucos metros, Ambrósio começava a se dar conta de quem era. Talvez por um bloqueio, causado pela morte violenta ou pelo processo utilizado para trazê-lo de volta à vida, não associava o travesti loiro à sua amada Jeitosinha.
Mas já sabia que ele era o chefe daquela casa que reconhecera e que estava deformado por alguma terrível razão, a mesma pela qual sentia-se impelido a manter-se escondido.
Na varanda da casa, Adenair começava sua revelação. Cada palavra que pronunciava causava-lhe dor.
- Bem, Bruno, também tenho um segredo.

Que segredo revelará Adenair a Bruno?

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