domingo, 15 de março de 2009

Capítulo IX - A Grande Surpresa


Passava da meia-noite quando Jeitosinha voltou para casa. Seu álibi foi perfeito: passou as últimas horas estudando Geografia com uma amiga, como costumava fazer.
Estava impressionada com a própria frieza. Conseguiu concentrar-se nos livros e conversar amenidades como se nada tivesse acontecido. Mas ainda sentia nas mãos o tremor da serra elétrica. Os gritos de Ambrósio continuavam a ecoar em seus ouvidos. Eram sensações surpreendentemente prazerosas.
Arrependimento, de fato, só o de ter perdido o capítulo da novela. "Mamãe eu matarei na hora do Jornal Nacional" - jurou a si mesma.
As luzes da sala estavam acesas. Viu pela janela os vultos de seus familiares. Entrou pela porta principal, preparando-se para fingir dor e desespero ao se deparar com os pedaços de carne, ossos e vísceras de seu pai espalhados pela sala. Qual não foi o seu espanto ao perceber que não havia na casa um só vestígio do seu crime hediondo!
Quatro de seus irmãos, inclusive Adenair, estavam assistindo televisão tranquilamente. Sua mãe já havia se recolhido ao quarto.
- Onde está papai? - perguntou.
- Foi pescar. - respondeu Amarildo, o segundo filho de Ambrósio e Marilena.
- Pescar?
- Sim, deixou um bilhete com mamãe, dizendo que resolveu na última hora e que só volta amanhã à noite.
As belas pernas de Jeitosinha estremeceram e ela sentiu uma estranha vertigem. Realmente seu pai era dado a estes rompantes e o sumiço não chegava a espantar ninguém em sua casa. ''Será que tudo não passou de uma alucinação?'' - questionou-se.
Mas não. Observando o revestimento plástico do sofá onde o crime havia acontecido, percebeu o cheiro de detergente e marcas de pano, que sugeriam uma limpeza recente.
Jeitosinha puxou seu cúmplice, Adenair, até o quarto.
- O que está acontecendo?
- Eu é que te pergunto! - retrucou o irmão. - Você não ia matar papai?
- Matei! Eu matei! Alguém escondeu os restos, limpou a sala e ainda deixou um falso bilhete para mamãe!
Adenair deu um gritinho ansioso e histérico. Jeitosinha esbofeteou-lhe a face e disse, resoluta:
- Calma! Você já esperou mais de 20 anos. Não acho que seja a melhor hora pra soltar a franga.

Qual estranho mistério esconde-se na casa de Jeitosinha?

0 comentários: